Monday, July 13, 2009

POEIRA VOLTOU

Poeira, o chefe do posto
Voltou
Mudou de nacionalidade
Cor e rosto
E voltou com sua brutalidade
Mudou de nacionalidade e regressou!

Poeira voltou
Para kuatar os filhos dos outros
Para kuatar os filhos dos negros
Mudou de rosto
E regressou
Mudou de rosto e regressou para nosso desgosto!

Poeira voltou
E anda pelos musseques do Rangel, Sambizanga, Samba…
São Paulo, Baixa, Mutamba…
Poeira regressou
Para novamente kuatar os filhos dos outros
Para novamente kuatar os filhos dos negros!

E andam muitos, um, dois, três, quatro Poeiras…
Andam em carrinhas pela cidade
Atrás das vendedoras
Atrás das zungueiras, com brutalidade
Poeira voltou
E cabeças a abanarem de desgosto, hum, hum, Poeira regressou!

Poeira voltou
E desce da carrinha armado a correr
Desce da carrinha armado e toca a bater
Porrada na zungueira
Porrada na vendedora
E mãos na cabeça em lamentos, aiué, aiué, Poeira regressou!

Poeira voltou
Recebe o negócio das zungueiras
Bate nas vendedoras
E corrida com os ambulantes
Poeira voltou, kibutos apressados em cabeças descontentes
E pensamentos revoltados, hum, hum, Poeira regressou!

Poeira voltou
Kibutos espalhados no passeio
Ponta-pés impiedosos no negócio da vendedora
Ponta-pés no ganha-pão da zungueira
Poeira voltou, ponta-pés implacáveis no suor alheio
E corações ressentidos, hum, hum, Poeira regressou!

Poeira, o colono que kuatava os filhos dos outros
O colono que kuatava os filhos dos negros
Mudou de cor e voltou
Mudou de nacionalidade e regressou
Poeira voltou e bate na vendedora
Poeira voltou e recebe o negócio da zungueira!

Poeira, o chefe do posto
Mudou de nome e nacionalidade e voltou com outra cor e outro rosto!


Kuatar: agarrar, prender
Zungueira: vendedoura ambulante
Kibutos: coisas, pertences

Décio Bettencourt Mateus

In “Os Meus Pés Descalços”

13 comments:

Anonymous said...

Décio,
por que será que eles sempre voltam?
Querido sinto falta da sua poesia.
Obrigada pelo comentário sempre carinhoso lá no blog e que bom que vc gostou da homenagem, foi de todo coração.
Mudando de assunto:como eu faço para comprar seu livro?
Bjs.

DECIO BETTENCOURT MATEUS said...

Fátima: obrigado pela presença (quase) habitual. E pelas palavras amáveis.

Os dois livros por mim publicados, "A Fúria do Mar" e "Os Meus Pés Descalços", encontram-se à venda apenas em Angola (infelizmente).

O lançamento do terceiro, "Xé Candongueiro", deverá acontecer no final deste ano ou início de 2010, segundo previsões.

Um kandandu

NAMIBIANO FERREIRA said...

Já sentiamos a falta de um novo poema. Meu mano, que grande POEMA, que excelente Mensagem, valeu a pena esperar... é uma grande realidade mas há certas poeiras que nunca se dissolvem, infelizmente sao uma inerencia da nossa condeicao humana. Eles, os Poeiras, pegam sempre no pé dos mais fracos bem lá no fundo sao uns cobardes.
Parabéns pelo poema, vou levá-lo comigo, ok mano?!

Kandandu!!!

DECIO BETTENCOURT MATEUS said...

Namibiano: "Poeira Voltou" ficará feliz de ser lavado por ti. E agradece. Assim pela encorajadora mensagem. Many thanks.

Kandandu.

NAMIBIANO FERREIRA said...

Mano, um presente para ti e agora nao te esquecas de o pendurar aqui no teu blog:
PRÉMIO BLOG DE OURO

Recebi este selo da amiga Graça Graúna http://ggrauna.blogspot.com/

Graça, muito obrigrado por este presente.
Para compartilhar, vamos às regras...
1. Exiba a imagem do selo “Blog de Ouro”;
2. Poste o link do blog de quem te indicou;
3. Indique 5 blogs de sua preferência;
4. Avise seus indicados;
5. Publique as regras;
6. Confira se os blogs indicados repassaram o selo.
Eis os meus indicados:

Poesia Lilaz-Carmim http://poesialilazcarmim.blogspot.com/

Hariapoiesis http://hariapoiesis.blogspot.com/

Mulembeira http://mulembeira.blogspot.com/

As Viagens de Alex http://asviagensdealex.blogspot.com/

Angola: Os Poetas http://angolapoetas.blogspot.com/

AFRICA EM POESIA said...

Que bonito. sentei e li...gostei
um
Kandandu

DECIO BETTENCOURT MATEUS said...

Lili Laranjo: sua visita é motivo de regozijo. Muito agradeço. Eh bem-vinda! Passei já, rapidamente, por "Africa em Poesia". Voltarei com mais calma. Gostei do acolhimento do seu blog e tocou-me o seu amor à poesia. Voltarei com mais vagar.

Um kandandu

AFRICA EM POESIA said...

Décio

estamos juntos meu irmão. Aqui eu sei que continuo aí...

A tua poeira
E tão real e tão sofrida...Como eu te entendo...
queria os teus livros mas posso pedir para mos compraremaí pois tenho muita gente amiga po aí...

Ainda não perdi a esperança de fazer mais livros de poesia só Africana...

o meu...A ti Negage Meu Amor ...é a minha paixão...


Com carinho deixo-te...palavras soltas



Recordando o Negage


Minha terra linda...
Como te recordo...
As saudades ficam...
E não vão embora..
Porque és feiticeira
E nunca me vais deixar...

Não me esqueço de ti!...
Com o teu encanto...
E tudo era bonito...
Com as tuas xitacas...
Pequenas e grandes...
com o teu capim...
Que tanto crescia..
Com os macacos...
A saltarem das árvores...
Até deles sinto a falta...

E eu aqui vou vivendo...
Mas não esquecendo...
O" cambuta"...
O que tinha o "mataco" grande...
O que mandava o amigo à "tuge”...
O que passava por nós...
e dizia... "Ó nanguié”...
ou o que realmente sentia frio...
E com um sorriso nos dizia:
"Kioge yà vulo"...
Ou o que nos trazia um presente ...
E nos oferecia uma "sange"...
E tanto mais...
E como é bom viver..
Mas...Como é bom recordar!...


Lili

DECIO BETTENCOURT MATEUS said...

Lili Laranjo: Se precisar de auxílio para compra dos meu livros, será com muito gosto. Muito obrigado pelo poema,em que se sente claramente a saudade da terra. Gostei.

Arlindo de Sousa said...

Amigo Decio Mateus,
Muitos dos que, como eu, estavam em Luanda na década de 1960, ouviram certamente falar do sinistro Poeira. E do terror que ele inspirava. Pelo que, ao encontrar a sua poesia “POEIRA VOLTOU”, li-a avidamente e achei-a extraordinária. Entre o muito que encontro nela, saliento: o facto de a ver como uma poesia de denúncia e intervenção; e também a constatação de que afinal o ser humano tem uma grande dificuldade em aprender com a história. Espero que, no caso de Angola, tal obstáculo não venha a desencadear, num futuro próximo, uma perigosíssima explosão social. De consequências imprevisíveis.

DECIO BETTENCOURT MATEUS said...

Amigo Arlindo: obrigado pela visita e comentário. Defendo ser também minha missão poética, trazer um pouco da dor e sofrimento das nossas gentes sofridas. Esperançoso de ajudar a trazer alguma melhoria a nossa sofrida terra. Volte mais vezes. Mulembeira agradece.

Arlindo de Sousa said...

Amigo Decio Mateus,
Fico-lhe grato pela gentileza das suas palavras. Pode estar certo de que passarei por aqui de vez em quando. Mulembeira já está averbado nos meus “Favoritos”. A minha preocupação agora é, em jeito de começo, tentar adquirir “OS MEUS PÉS DESCALÇOS”. Saudações.

DECIO BETTENCOURT MATEUS said...

Arlindo: mais uma vez, agradecido. E agradecido por ter adicionado "Mulembeira" aos seus favoritos. Confesso alguma dificuldade de aceder o seu blog, favor tecle aqui. Por outra gostaria também ter o seu e-mail para vermos como fazer para que "Os Meus Pés Descalços" viagem até si.

Kandandu.